A Aventura da (des)evolução

Há 15, 20 anos atrás "já" se viam e por exemplo:

- Tunas espanholas - pasme-se! - a tocar trompete em determinado tema - Tuna de Ciências de Granada com "Mama son de la Loma" - (e curioso, alguns pensadores espanhois da tuna de então em Espanha diziam que as tunas espanholas sofriam de "sudamericanitis" aguda nos seus reportórios...);

- Tunas a fazerem autênticos espectáculos totais encenados e com uma "mise en scene" digna da cinematografia de Hollywood;

- Tunas a cantar temas em lingua francesa, por exemplo;

- Várias Tunas de vários países a tocar peças ou excertos de peças clássicas ou óperas;

- Quem nunca se tenha intitulado como Tuna e fizesse coisas parecidas com os que a Tuna em sentido lato faz até (exemplo objectivo: Orxestra Pitagórica)

Como se constata, a inovação é uma característica não de hoje mas antes de sempre.

Mais adianto; Em 1964, repito, 1964, uma tuna espanhola gravou um LP onde se poderia ler na sua contracapa o seguinte texto e sobre os temas que gravara nesse LP:

"Durante mucho tiempo se ha entendido la canción de tuna, la estudiantina, de un modo quizás excesivamente estrecho. Frente al concepto de considerar sólo dentro de la ortodoxia a las 10 o 15 canciones clásicas, se abre paso, cada día más, un nuevo concepto más amplio y que, indudablemente, vigorizará el eterno repertorio de las tunas universitarias.
Entendemos en principio, que una estudiantina ha de ser una canción de amor, una canción digna de ser cantada al pié de una reja. Pero no toda canción de amor podrá ser una estudiantina; para ello debe tener además “aire”. Pero ¿ qué es aire ?. Es un término de muy difícil definición. Quizás haya que ser tuno para saberlo. Es una especie de ritmo, un modo especial de cantar, una cadencia que no todas las canciones pueden adquirir.


Creemos que todas las canciones incluidas en este disco tienen “aire”. Y como además, que duda cabe, son canciones de amor, no vacilaremos en calificarlas de estudiantinas con todos los honores. Por otro lado, el interés del disco aumenta en cuanto que las canciones escogidas son una cumplida muestra de varios criterios de entender la ESTUDIANTINA (...)" (fim de citação)

Como poderemos facilmente aferir, esta "discussão" de hoje não foi "inventada" por cá e muito menos pela actual geração tunante, fica o reparo histórico a demostrá-lo cabalmente. Ou seja, está tudo inventado em Tunas e até esta discussão é velha de 40 e picos anos....

A questão fulcral aqui será quando se perde o sentido daquilo que somos e fazemos, usando a excepção da continuidade evolutiva como regra da continuidade descaracterizadora e, por isso, negativa. Bem sei o quão dificil pode ser para alguns esta "discussão"; mormente a mesma dificuldade, ela não pode nunca desvirtuar o que é evoluir, inovar com nexo por oposição à conveniência circunstancial de se ter alguém na Tuna que e como toca muito bem p.ex. sampler, aqui vai alho e sampler em palco ou mesmo na rua (como diria alguém, isso de sampler na rua é que seria de "muito valor"...).

Nunca foi uma discussão fácil esta dos instrumentos e da sonoridade de tuna e dos sons que a Tuna produz ou emite enquanto Tuna (outros que não o são podem, em rigor e coerência até, produzir os sons que bem entendem e como entendem, desde que mudem o rótulo que porventura ostentem, excelente, nada a opôr e muito bem até: a Orxestra Pitagórica nunca se intitulou Tuna e era composta por estudantes universitários que produziam música em palcos como os que todos nós pisamos, por exemplo).

Como vimos nos contributos dados nos ENT´s, até em tempos a Tuna espanhola usou bandolins, prova da vitalidade do fenómeno e da noção de miscigenação da cultura tunante que não é património de hoje sequer, é de sempre. Não me choca nada - independentemente de gostar deste ou não daquele instrumento numa tuna - que seja usado num tema que assim o justifique um qualquer instrumento.

O que não considero legitimo é assentar - e dentro de um todo do fenómeno tunante - um espectáculo inteiro ou mesmo uma "noção" de tuna em qualquer circunstancia no simples facto de que "se temos excelentes executantes de balalaika, então tocam todos balalaika" ou "se temos 20 excelentes actores de teatro" passemos então na Tuna a fazer peças de teatro e por aí fora; A Tuna se reparamos com atenção na sua evolução e inovação histórica sempre se adaptou aos tempos, também não é patrimonio de hoje esta noção, é de sempre; o tocar de pé - e tocar sentado é de Tuna, claramente - o baile de pandeireta, o baile de estandarte, a beca das tunas espanholas que é peça recente no tempo, os certames e seu figurino organizativo, etc etc, todos estes traços evoluiram e muito bem.

Evoluir não significa que se destroí o conceito Tuna, nada disso; evoluir significa pegar no que para trás existiu e dar-lhe novo fôlego mas mantendo os traços característicos de sempre de alguma forma. E hoje será assim, pergunto???

Mais adianto; nunca a evolução da Tuna teve um catalizador claro, objectivo e único - o certame competitivo no caso. Já noutros tempos, a Tuna evolui também e sem o certame a potenciar as evoluções, antes a própria vivência no tempo o potenciava, o exigia, não carecia de premiações a evolução tunante.

Hoje esta discussão de sempre só existe não por força de mais nada a não ser da enorme vontade em mostrar algo que ninguém tem e em cima de um palco; melhor seria se fosse esta discussão derivada da vontade de se mostrar mais numa serenata, por exemplo.

A Tuna está a mudar, é obvio; a evoluir (espero); se não for evolução, então é invenção pura e dura ao sabor de conveniências pontuais que estão intimamente ligadas à COMPETIÇÃO entre tunas, numa espécie de "jogo de espelhos" que se esquece do essencial: da Tuna em si mesma enquanto tal. Valha então o resto: os copos, as jantaradas e o convivio, coisas que não são de todo monopólio da Tuna; há muitas formas de expressar tudo isso sem se estar necessáriamente a falar de Tuna.

Como alguém sabiamente disse há - lá está! - uns 15 anos atrás "quando a malta perceber que há muitas outras formas de apanhar umas pielas, viajar e ver umas marias roliças na cidade do lado, a coisa vai acalmar..."...

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